O esporte é a forma de sublimar ou "abstrair", criar uma ficção,enfim, para representar, teatralmente, no anfiteatro dos esportes, circunstâncias fáticas em tempos remotos, quando a caverna era a casa; o lar : a caverna. Uma caverna em Platão: metafórica, alegórica, na idealidade ou essência dada pelo pensamento humano, tomado pela imaginação fértil, outra na realidade, no campo da existência, com giesta e ervas amargas para temperar a vida.
Ao se correr os 100 metros rasos, na olimpíada, ou a maratona, outra modalidade olímpica, está-se "abstraindo " o ato, que foi um ato no tempo real e agora é um fato escavado como lembrança, memória ou inteligencia, no código genético, que tem registrada toda a história da vida pregressa dos ascendentes e antepassados.
Ao se abalar para uma disputa esportiva, disparar na correria louca dos cem metros rasos, o esportista está correndo em
dois modos de memória ou na raia de duas memórias, dois espaços geométricos de memória; a saber : está sob a pressão da
memória genética e da memória de contexto : que não é atual à disputa, mas está no contexto cultural e histórico em que o atleta habita; quer dizer, corre contextualizado e, simultaneamente, descontextualizado, nos dois espaços-planos da memória genética e atuante ; descontextualização essa que , inobstante as barras contextuais, que prende o atleta-homem ao tempo-espaço na dimensão tripla ou quádrupla, se mescla ou se com matiza com a memória contextual e, destarte, se intercontextualiza.
Corre com a chita ao encalço do velho ou criança que foi um belo dia, nos tempos das cavernas, no corpo de um antepassado longínquo, que resta no corpo atual do descendente em forma escrita em língua de geóglifos nos genes, em memória
genética.
Corre pressuroso, dispara em direção horizontal, célere, angustiado, acossado pelo guepardo que agora é imaginário, fictício, metaforizado, representado num holograma de memória do antepassado ferido de morte pele besta..., corre!, enfim, a fim de obter o prêmio da vida e, concomitantemente, para salvar-se das garras e do estrangulamento do perpetrado pelo predador selvático, o guepardo, ( a chita pintada ou o chita pintado) que o derrubou na antiga savana, durante a perseguição breve, mas funesta, numa da corrida para a morte ( dos que chegam em segundo lugar em diante ) ou para a vida e os louros da vitória para aquele que percorre ( e percorreu) em menos tempo os cem metros rasos, desesperado, espavorido, com a lembrança-fantasma do antepassado a evocar o lugar aonde ocorreu a queda brusca, onde caiu atingido pela pata e garras do animal, e pode, destarte, provar, sentir, amargar, a dor da derrota derradeira, antes de exalar o último suspiro, antes de expirar ou, no caso de vitória, ao desabalar em fuga alucinada a fim de escapar à sanha assassina de fera sanguinolenta, veloz e assustadora como o corisco a rasgar a mortalha da treva : mortalha da luz, nela enrolada, envolta, ungida e enterrada na noite, a escura dama que é a noite à maneira de Joan Miró.
( Toda descrição em modo de memória genética é bastante truncada.)
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